A dor dos dias que se foram, a dor que se foi, a dor que não volta, você que se foi, eu que agora volto a sorrir, um dia isso escrevi.
Ela me doía à alma. Enquanto olhava o seu retrato, a música do filme que acabara de ver tocava. Como eu queria ter visto
esse filme ao lado daquela moça. Logo esse filme que fala de vida, da doçura de viver. Porque eu que era tão triste antes
de você chegar, pude sorrir quando senti os seus lábios. Hoje, num domingo desses que a vida que já não tinha sentido perde
seu brilho, o labor de continuar a sorrir me entristece. Sinto sua falta. Terceira taça de vinho. Segunda lata de cerveja.
Meus sentidos estão atordoados, mas é só mais um porre. Um porre de tristeza que nunca mais passou desde que você mudou-se
da minha realidade para os meus enleados sonhos. Sinto-me cada vez mais presentes dentro dos poemas de penumbra. A sofreguidão
já não é tão dura. Noutra taça descubro-me nas incertezas desses esmorecimentos que circulam por entre linhas perdidas.
A dor não é mais dor, dor é rotina. Tu és vício de injúria, mulher. O amargo, simplesmente o amargo me define. Limito-me
a pensar na angustia de outrem - posso me livrar da minha. E tu, não crês na minha lamúria, no esmorecimento do meu corpo.
Talvez, quem sabe, seja porque ao me ver pela vista tens a imagem da exaustão da felicidade, do canto alegre de Caetano.
Mais uma cerveja. Afundo-me, perco o sentido, a vista embaraça, a música arde pela voracidade das lembranças que me remetem
a você. Até quando serei choro e peito armado? Saltito, saltito em breve remoçarei, tornarei-me moça de alma alegre e dizer-te-ei
apenas o quanto te amei sem mágoas. Por enquanto, o mundo acaba num copo vazio.
Ah, como eu desejo não ter as lágrimas como companhia essa noite. Essa ausência tua dói-me a alma. E ando padecendo, dia após dia, essa ausência tua tem me roubado a alegria de viver. Não deixei de sorrir, de falar poesia e ouvir Caetano, mas dentro, aqui dentro, o dissabor de viver se espalha, agonizando, em estado de algia, meu coração morre lentamente... e os versos de alegria, o otimismo dos dias, deixo escrito nessas linhas: não passa de farsa, afinal todo ator tem sua máscara. Minha realidade é de comiseração.
POEMA DA MORTE
Mas qual será o tamanho do nosso boletim de omissão?
Numa finitude infinita de ladrão, paradoxalmente,
matando-nos ...morremos
morremos por dentro, de ver a tristeza que não tem fim e
sorrimos
sorrimos para aliviar a nossa dor, e no fim, somos iguais
aqueles que julgamos: egoístas
dormimos de cabeça baixa, amanhecemos procurando prozac
buscando cor à vida e sua finitude de virtudes, que outrora
deixa de ser principio apenas pela perenidade das coisas em
vão, ah, vida!
Morremos ... que ironia!
e choramos ao perceber qual o ritmo da vida:enquanto um
sorri, o outro chora, pela dor que nós é semeada
e nesse embalo, a gente segue, morrendo, pacientemente somos
morte
Morremos ao negar a mão ao alheio, aquele que sujou as mãos
para cosntruir nossos tão exaltados edifícios
Mãos sujos de colher o alimento que de sorriso estampado
compramos no mercado da hipocrisia
infinita guerra pelo pão
comendo na mão de quem possui o bolso maior
chora, chora o cidadão
Colombo se foi, o ouro acabou, as consequências não
quem não percebeu e continuou a exploração?!
negro, pobre, gente com dom da paixão, sofre com a difusão
de conceitos, a errônia ideia de viver
que nós leva ao chão
morremos...morremos
saberá eu se ainda somos humanos?!
ao que tudo indica somos zumbis, inerentes a paz
em detrerimento do sentido da vida
mas que vida?
se a criança chora e na calçada alguém tem fome enquanto um
pastor prega, roubando o resultado do suor dos irmãos
e essa alusão com a liberdade? mas que pena!
essa merreca de vida, que não é boa nem bonita, nos faz
prisioneiros
e os animais, vulgarmente conhecidos pela inferioridade,
irracionalidade
cantam, vivem, semeam e quando colhem, sorriem
verdadeiramente
enquanto, no mesmo momento, atrás dos nossos sorrisos
largos, um coração triste, uma multidão de solidão
a maquiagem cobre a dor da Maria, o cansaço a tristeza do Zé
e no final, no fim da copa e da novela, temos a certeza:
morremos!
Omissão, pura omissão, fingimento, medo, escuridão, nosso
elo é apenas de dor. A vida é bonita pra quem cria uma ilusão!
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